quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Poesia Brocada
(Iara Assessú)

Não gosto de poesia pronta.
Gosto de poesia cheia
De versinhos e in-versões
De pele enrugada e areia
Gosto de poesia torta
Porta, parede e meia
Meio tonta e descarada
Grudada num chão rachado
Estado de suor alheio
Debaixo do seio ou do braço.
Não gosto de poesia pronta.
Gosto de  poesia bichada
Coisada e obscena
Cena de praça  e mão no olho
Filme estérico sem graça
De amor mal interpretado
Gosto de poesia bocada
Sem termo, gasto ou corda
De prosa bem esquentada,
De ontem e nada forçado
Não gosto de poesia pronta.
Gosto de poesia foda
De flor, aceno e pigarro.
De cigarro comprado no posto
De poesia pronta, não gosto.
De poesia pronta, não pasto.
Não gosto de poesia fada
Gosto de poesia  brocada.


Genealogia


Queria ter outra árvore dessa em meu quintal
Se não no meu quintal, que fosse no teu
Ou que fosse no mesmo caminho da tua casa
Ou que fosse na praça mais próxima dali
Interessa saber é que fosse uma árvore
Interessa saber é que estivesse próxima
E que atrapalhasse o progresso
Que agasalhasse com suas folhagens
Todas as chuvas, todos dezembros, todo solzinho
Todos os pensamentos e ninhos, todo avozinho

Queria mesmo era que fosse de fruta e tronco
Podia ser estro, podia ser grito, podia ser canto
Podia ser um dedilhado de cordas trocadas
Mas que tivesse galhos, gritos, crivos, sombras
Mas que tivesse falha, gruta, graça, crianças
E que arremessasse o pouco afeto
Que se apresentasse mesmo, como árvore
Todas as folhas, todos os Maios, toda florada
Toda meada, toda solidão em meias palavras

Queria mesmo era nos dedicar qualquer sombra
Que fosse do tempo em que havia sorriso
Se não dos quintais, que fosse da rua que fosse
Se não da rua, que fosse da praça que fosse
Mas que tivesse árvore, gente, gomos e banjos
Mas que tivesse vozes, coros, cores, arpejos
E que arredasse daqui pra longe
E que jogasse pra longe o aziago
Aquele de coisa pronta e acabada que nos forçam
Aquele que de tanta falta de raiz, não se reinventa

Queria a pimenta que cala e canta quando preciso
A amêndoa de caldo na boca e o fundo do mantra
E mais os quintais coletivos, com cara de praça e pipoca



Geslaney Brito

Desamarração
                         

Tem hora que dá pra ver
Azul-laranja em gomos
Somos a fumaça do olhar

Crepita um sonho ave
Vexame é não ter asa
A Nasa não conhece o mar

Azar desses foguetes
Tão bonitos, sumidouros
Tão precisados de cardume

Que se desnude a roupa
Branca, total e radiante
Antes que o céu nos fume

Têm horas bem diamantes
No estágio mais carvão
Ilusão é coisa acreditada

Crepita e arranha, o grão
Vez em sempre ele eclode
E sacode a terra ávida

Azar dessa ciência
Tão bonita e sumidoura
Tão precisada de crisálida

Que se enxerguem a nós
E ao simples que se desamarra
Desarmando-se, simplesmente

                                                           Geslaney Brito

sábado, 6 de agosto de 2011

À Praça

À Iara Assessú

Certa vez, eu disse:
Não me lembro qual vez
Sequer lembro o que disse
Pode ter sido há um mês
Ter dito a boca de Eunice
Sei que falei o que na hora li
Lira, litro, lívido, enciclopédia
Tudo pedia para que eu dissesse
Barulho, zoada, onomatopéia
Sem hematoma na língua, eu disse

O que eu disse, desapareceu
Foi tomar café no Café Nice
Foi sentir saudades no Liceu
Listou, legou, lidou, amanheceu
Mas o que eu disse certa vez
Não foi em árabe ou libanês
Foi o que eu tive n’aquela hora
Uma casa, um elefante, uma amora
Um sorriso elegante à mostra
Não lembro. Por dentro ou por fora

Por hora, antes, depois, não sei
Eu sei é que no ato de dizer
Senti que era tudo para ver
Ave, veia, vela, avelã, valeu o dia!
Meus deuses ajudaram na poesia
Certa vez eu disse o que foi de fato
Na cidade, como pelo mato
Lenha, cuia, curva, senha, sorver
Fui ao passeio na praça com você
Foi isso que eu disse...

Geslaney Brito
Trama Virtual
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